Policiais ganham reality shows e cadeira cativa na TV
Seja comentando as megaoperações contra o tráfico na Vila Cruzeiro ou  Alemão, no Rio, seja atendendo ocorrências de crimes passionais, em São  Paulo, a figura do policial tem sido cada vez mais 
presente na TV  brasileira. Mas o apresentador raivoso e barulhento, que esmurra a  bancada para demonstrar sua indignação com a criminalidade, está saindo  de moda.Em um telejornal como o "RJTV", o ex-capitão do Bope Rodrigo Pimentel  analisa o lado técnico das ações policiais. E, nos programas sobre  violência urbana, os novos astros são policiais em ação, num formato  televisivo mais pop: o reality show.
Diferente do caçador de traficantes fardado mostrado no cinema, o  “capitão Nascimento da TV” dirige sua viatura em alta velocidade para  perseguir ladrões de carros, apartar “desinteligências” entre vizinhos e  até resgatar o gatinho da aposentada no telhado. Tudo acompanhado do  produtor e do cinegrafista de uma emissora.
Seguem essa linguagem o “Operação de risco“, da Rede TV!, e o “Polícia  24 horas”, da Band. As duas atrações estrearam este ano e rendem índices  significativos de audiência para os canais.
Apresentado por Alexandre Zakir, ex-delegado do Departamento de  Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP) e atualmente corregedor da  Secretaria Estadual de Saúde, o “Operação de risco” exibe o desenrolar  de até três casos atendidos pelas polícias Militar, Civil e Científica.
Segundo Zakir, semanalmente, são gravadas mais de 2.000 horas de  ocorrências em diversos pontos de São Paulo e o roteirista Beto Ribeiro  transforma os “QRUs” - chamados pelo rádio - em histórias interessantes  para o espectador.
“Faço algumas adaptações no texto, com adequações de termos jurídicos.  Os policiais têm seus neologismos, então também ajudo a traduzi-los para  o público”, conta o apresentador.
Zakir explica o êxito do formato como “tendência que atende uma  necessidade do público”. “Acho que as pessoas cansaram dos antigos  policialescos, que só serviam para aumentar a sensação de insegurança.  Mostravam-se os crimes, a revolta, mas nunca o que a polícia estava  fazendo para acabar com aquilo”, opina o apresentador. “Agora o  telespectador tem dimensão do problema, mas sabe que há policiais  trabalhando empenhados, que se arriscam dia-a-dia para combater o  crime”.
“Cops” brasileiroAcompanhar a rotina policial em  uma grande metrópole não é inovação da TV brasileira. Nos Estados  Unidos, séries como “Cops” já usam o formato desde 1989.
Bem parecido com o "primo” americano é o “Polícia 24 horas”, da Band.  Trazido pela produtora argentina Eyeworks Cuatro Cabezas – a mesma do  humorístico “CQC” – o programa não tem apresentador, traz apenas os  policias em campo, numa edição dinâmica e, dependendo da ocorrência,  acrescentando até pitadas de humor.
“Acho que as pessoas cansaram dos antigos policialescos, que só   serviam para aumentavar a sensação de insegurança. Mostravam-se os  crimes, mas nunca o que a polícia estava fazendo para acabar com aquilo”
Alexandre Zakir, ex-delegado do DHPP e apresentador do 'Operação de risco'
Casos mais sérios, como perseguição a um chefão do tráfico, têm músicas  de suspense como trilha sonora. Mas é comum o uso de sonoplastia  engraçadinha em episódios como discussões acaloradas de trânsito ou  jovens suspeitos que urinam nas calças ao serem abordados para revistas.
“Esses elementos são utilizados somente para reforçar as situações  absurdas que a polícia deve enfrentar no dia-a-dia”, explica Juan José  Buezas, diretor do “Polícia 24 horas”. “O programa mostra como a polícia  pode intervir no cotidiano da comunidade não só em ações que incluem  confrontos, mas também como peça-chave na vida dos bairros”, completa.
Porta-voz da Polícia Militar de São Paulo, o capitão Sérgio Marques é  quem encaminha a emissora a rotina dos batalhões a serem filmados. “Os  policiais recebem a orientação de agir naturalmente, seguindo os  procedimentos operacionais padrão. Claro que ele terá que zelar pela  segurança da equipe de TV que leva na viatura. Nós obrigamos todos a  usar colete à prova de balas”, esclarece.
Marques descarta a possibilidade de os militares cometerem atos de  heroísmo em frente às câmeras para ganhar mais visibilidade nos  programas. “Nesse aspecto a gente fica bem tranquilo, porque o  testemunho de uma equipe de televisão garante transparência às ações  desses policiais. Se ele cometer alguma infração, sabe que será punido  com rigor”.
Especialistas em segurança pública concordam que ainda não existe a possibilidade de um “Cops” versão carioca. “Seria muito arriscado para uma equipe de TV acompanhar a nossa rotina. O policial do Rio de Janeiro enfrenta armas de guerra em confrontos”, opina o capitão Ivan Blaz, chefe de comunicação do Batalhão de Operações Especiais (Bope).
Acho que qualquer policial do Rio de Janeiro pode fazer uma boa  análise do que acontece no dia-a-dia da cidade, com mais propriedade que  um acadêmico"
Rodrigo Pimentel, autor de 'Elite da tropa' e comentarista de segurança pública da TV Globo
No entanto, as recentes coberturas midiáticas das ações na Vila  Cruzeiro e no Complexo do Alemão tiveram efeito de um “Big Brother” na  vida dos militares envolvidos. “A imprensa jogou luz para fatos até  então desconhecidos pelos cidadãos. Foi mostrado o drama familiar do  policial que ficou cinco dias sem voltar para casa e o quanto os  moradores das comunidades ansiavam por aquelas operações”, cita Blaz.
O capitão cita como imagem mais forte mostrada pela imprensa aquela em  que dezenas de bandidos fugiram desesperados do cerco policial na Vila  Cruzeiro. “Aquelas cenas, transmitidas por diversas emissoras, nos  ajudaram na operação seguinte: a realizada no Complexo do Alemão. Os  marginais que assistiram àquele momento, certamente desistiram de  apresentar alguma resistência à nossa chegada.”
A figura do policial ganhou os holofotes não apenas no acompanhamento in loco  das câmeras, mas também como analista de tudo o que estava sendo  mostrado nos telejornais. Caso de Rodrigo Pimentel,  ex-capitão do Bope e  um dos autores do livro que inspirou o filme “Tropa de elite”, que se  tornou comentarista de segurança pública nos programas jornalísticos da  TV Globo.
“Acredito que, se essas ações no Rio tivessem acontecido há dez anos,  certamente seria um sociólogo ou um antropólogo o convidado a comentar  os fatos na TV”, opina Pimentel. “Sempre fui procurado para dar  entrevistas, mas nunca para falar olhando diretamente para o espectador,  em linha direta. Acho que qualquer policial do Rio de Janeiro pode  fazer uma boa análise do que acontece no dia-a-dia da cidade, com mais  propriedade que um acadêmico”.
Pimentel destaca que a polícia deve “aproveitar essa fase exposição  midiática para se reaproximar da sociedade”. “Desde ‘Tropa de elite’ a  autoestima do policial aumentou. Hoje, quando os policiais do Bope  treinam na praia, são aplaudidos pela população”, afirma. “Nos meus  comentários, tento aproveitar brechas para falar dos salários baixos da  categoria, por exemplo. Esse é um reconhecimento que ainda falta para a  nossa polícia”.
Claro que a polícia erra, mas ainda temos nossos herois"
Capitão Sérgio Marques, porta-voz da Polícia Militar de São Paulo
O capitão Sérgio Marques, da Polícia Militar de São Paulo, confirma  essa “boa fase”. Ele diz que houve aumento das inscrições para a  Academia do Barro Branco, de formação de policiais em 2010. “O jovem  gosta de adrenalina e isso é o que o cinema e a TV estão mostrando no  cotidiano do policial”, explica. “Antes, a imprensa expunha o policial  corrupto, cometendo atos de violência. Agora, finalmente, 
"Policiais ganham reality shows e cadeira cativa na TV"
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